Esporte
Quando era proibido mulher jogar futebol no Brasil

DEUTSCHE WELLEi
A proibição do futebol estava implícita, e isso extinguiu um movimento que, segundo especialistas e estudiosos do tema, estava em ascensão, sobretudo no Rio – no subúrbio, havia 15 times de mulheres competindo entre si, conforme relata a historiadora Aira Bonfim, pesquisadora do Museu do Futebol, em seu livro Futebol feminino no Brasil – 1914 a 1941.
“Isso precisa ficar claro: não se proíbe algo que não existe. Então precisamos ressaltar que mulher já jogava futebol na época da proibição”, afirma à DW Brasil a historiadora Fernanda Ribeiro Haag, pesquisadora da Universidade de São Paulo (USP) e professora no Centro Universitário Internacional Uninter. “Nos anos 1930 houve um crescimento intenso de mulheres praticando futebol no Brasil.”
Em 1965, já sob outro período ditatorial, o regime militar, o CND deixou clara a proibição. Ao divulgar uma lista de modalidades cuja prática estava proibida para o sexo feminino, o futebol estava incluído.
Fundamentação misógina
O argumento por trás da determinação se apoiava numa visão extremamente conservadora e patriarcal dos papéis de gênero da sociedade. Em sua dissertação de mestrado sobre o assunto, defendida em 2015 na USP, a historiadora Giovana Capucim e Silva ressalta que o foco estava nas práticas esportivas que acarretassem “contato físico intenso ou esforço excessivo”.
“Segundo os médicos da época, o potencial materno das moças podia ser prejudicado”, descreve a historiadora, contextualizando que “a elas era determinado seguirem aquilo que se entendia como o papel feminino na sociedade: a geração de filhos fortes para a nação”.
Em seu trabalho, ela cita a fundamentação do médico higienista Belisário Penna (1868-1939), que defendia que “a mulher encontrará a verdadeira esfera de ação, adequada ao sexo e aos seus deveres, no desempenho das funções do lar, da família, da escola e de tudo quanto tenha relação com esses fundamentos das sociedades moralizadas e sadias”.
No livro História das mulheres do Brasil, a historiadora Magali Engel ressalta que “a maternidade era vista como a verdadeira essência da mulher, inscrita em sua própria natureza”.
Haag acrescenta que a proibição respaldava “a ideia de que o corpo da mulher não é adequado ao futebol”, porque o esporte “fugiria do ideal da feminilidade”, cabendo à mulher “ser delicada, frágil e servir à maternidade”. “Estava ligada à premissa de que as mulheres pertenciam à esfera privada, e não à esfera pública”, explica.
Nesse contexto, em 7 de maio de 1940, um cidadão comum, autor de livros pouco conhecidos sobre moral “e bons costumes”, extremamente conservador, decidiu endereçar uma carta aberta, publicada em jornal, ao presidente Vargas. Seu nome era José Fuzeira e ele é considerado o “culpado” pela bizarra proibição.
Fuzeira argumentava que a modalidade feminina do futebol era “um disparate” e que não deveria “prosseguir”. Ele ainda argumentava, enfatizando não ter qualquer autoridade “educacional ou científica”, que o crescimento da prática no Rio poderia se alastrar pelo país e prejudicar “o equilíbrio psicológico das funções orgânicas [da mulher], devido à natureza que a dispôs a ser mãe”.
A partir dali, estudiosos identificam o começo de uma perseguição da imprensa à modalidade feminina, até a assinatura do decreto, em 14 de abril de 1941.
Autoritarismo e gênero
Embora o caso brasileiro tenha sido emblemático, ele seguia uma corrente internacional. “A Inglaterra baniu o futebol feminino na década de 1920, e outros países também tinham essa discussão”, comenta Haag. Em determinado período do século 20, o futebol feminino foi restrito a homens também na Alemanha, França e Bélgica, entre outros países.
A historiadora destaca, contudo, esses dois momentos das legislações brasileiras: a norma de 1941 e a de 1965. “Estamos falando de Estado Novo, ou seja, ditadura varguista, e ditadura militar. Cortes de direitos de mulheres e outras minorias, não à toa, costumam ocorrer em contextos autoritários.”
Pesquisadora na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a historiadora Maíra Rosin enfatiza que “no Brasil há uma série de legislações que controlam o corpo feminino”. “Essa lei de 1941 é contemporânea à mesma que confina as mulheres [que viviam da prostituição] na zona de meretrício do bairro do Bom Retiro [em São Paulo]. Há um controle feminino muito acentuado e uma interpretação de base eugenista que basicamente diz que as mulheres são feitas para trabalhar no espaço doméstico, que seus corpos não são compatíveis com as práticas esportivas”, contextualiza Rosin, à DW Brasil.
A legislação foi abolida em 1979. E não por acaso: a historiadora Haag recorda que era um momento de efervescência social, com o crescimento de movimentos pela redemocratização, de lutas operárias e de afirmação de minorias – dentre elas, a questão feminina.
Consequências perduram
Só quatro anos mais tarde, em 1983, a modalidade feminina do futebol foi regulamentada no país. Para quem estuda o tema, isso trouxe consequências no próprio envolvimento da mulher com o futebol. E é um dos motivos que explica a disparidade entre os times e as seleções masculina e feminina.
Haag vê a modalidade pagando o preço até hoje, com problemas de estrutura, de calendário dos campeonatos e de profissionalização, o que acarreta “defasagem técnica e tática”. “As mulheres estão conquistando esse espaço com o pé na porta”, comenta. “Mesmo que ainda haja uma continuidade do imaginário que afasta as meninas e as mulheres do futebol.”
Em conversa com a DW Brasil, a antropóloga Mariana Mandelli, pesquisadora na USP, diz que “as quase quatro décadas de proibição deixaram marcas profundas nas relações que as mulheres estabeleceram e ainda estabelecem com o esporte, no jogar, no torcer e no trabalhar de forma geral”.
“Aquele discurso de que o pé da mulher não foi feito para calçar chuteira e que a prática do futebol iria prejudicar as funções compulsórias da maternidade ainda está presente de maneira geral”, avalia ela.
“O esporte mostra o corpo e isso traz uma série de relações, desde o medo de que as mulheres se destaquem mais do que os homens, algo que perdura até hoje”, diz Rosin. E a ótica masculina está presente até quando a análise é sobre talentos femininos. A jogadora Marta, por exemplo, considerada a melhor do mundo, costuma ser chamada de “Pelé de saias”. “E não é. A Marta é a Marta e ela joga muito bem, joga como uma mulher e é a melhor.”
“Sempre se tenta ‘masculinizar’ o corpo feminino que joga futebol, porque a leitura é que a mulher que joga futebol sai do espaço doméstico dedicado a ela e toma um ambiente que, na visão dessas pessoas, seria exclusivamente masculino”, ressalta a historiadora.
No ambiente das torcidas, que os homens buscaram hegemonizar, a misoginia – e, em muitos casos, a homofobia – são consequência dessa mentalidade. Um jogador de time rival ser ofendido de “maricas” ou receber um comentário do tipo “parece uma mulherzinha jogando” não é nada mais do que a ratificação desse pensamento retrógrado e preconceituoso.
Passos grandes já foram dados, e golaços estão sendo marcados, como é caso da visibilidade que está tendo a Copa do Mundo de 2023. Mas, como pondera Mandelli, ainda há um processo longo para “mudar essa cultura” e finalmente equiparar as condições entre homens e mulheres no futebol.
Fonte: IstoÉ

Esporte
Rebeca Andrade e Caio Bonfim são os melhores atletas de 2024; veja todos os premiados

Rebeca, que se tornou em Paris a maior medalhista da história do Brasil em Jogos Olímpicos, superou a judoca Beatriz Souza e a canoísta Ana Sátila para levar o prêmio.
Desta vez, Rebeca não foi à cerimônia porque está fora do País, em viagem a lazer com as colegas da ginástica. Mas gravou um recado sucinto em vídeo. “Quero agradecer a todos que fizeram que o ano da ginástica fosse histórico”, comentou ela.
Outra vitória da ginástica na cerimônia foi a eleição de Francisco Porath, o Chico, como melhor técnico. É ele o responsável pelo sucesso da ginástica brasileira. “Muiitas pessoas aposentaram essas meninas”, desabafou ele. “Mas agora tem fila de meninas querendo fazer ginástica. O Brasil tem que ser o país da ginástica”.
Entre os homens, Caio Bonfim, que fez história nas ruas de Paris, conquistou seu o prêmio pela primeira vez ao superar o multimedalhista Isaquias Queiroz, da canoagem, e Edival Pontes, do taekwondo. O brasiliense de 33 anos ganhou na capital francesa a medalha de prata na marcha atlética de 20 km para o Brasil – a primeira da história para o país.
Carismático, brincalhão e emocionado, ele repassou seu início acidentado no esporte até festejar a primeira medalha em sua quarta Olimpíada. “Não desisti, fui para mais um ciclo, tentei de novo e acho que fui o primeiro a ganhar a medalha na quarta edição. Saí de Paris com a melhor das lições: acredite no sonho de vocês e trabalhe. Vale a pena”, afirmou o grande vencedor da noite.
Caio também foi escolhido, por voto popular, o Atleta da Torcida. Outras duas categorias foram escolhidas por meio de voto popular: Atleta Revelação e o Prêmio Inspire. Os vencedores foram, respectivamente. Gustavo “Bala Loka” (ciclismo BMX freestyle) e Ana Sátila (canoagem).
Lenda do vôlei, José Roberto Guimarães foi condecorado com o Troféu Adhemar Ferreira da Silva, destinado, segundo o COB, a personalidades do esporte que representam os valores que marcaram a carreira e a vida do bicampeão olímpico no salto triplo, como ética, eficiência técnica e física, esportividade, respeito ao próximo, companheirismo e espírito coletivo.
Homenagens e despedidas
Zé Roberto é um dos maiores vencedores do esporte nacional, responsável por levar as seleções de vôlei a cinco medalhas olímpicas. É o único brasileiro tricampeão olímpico, embora nunca tenha sido premiado com medalhas em razão das regras dos Jogos Olímpicos, que premiam apenas os jogadores.
“Agradeço cada sorriso, cada aperto de mão, a solidariedade, principalmente quando a gente perdeu para os Estados Unidos (nas semifinais dos Jogos de Paris)”, discursou Zé Roberto, que aceitou renovar seu contrato por mais quatro anos. Caso leve o Brasil aos Jogos Olímpicos de Los Angeles 2028, ele completará 25 anos ininterruptos como treinador da seleção feminina, feito histórico.
“O que me faz continuar é representar 220 milhões de pessoas. É vestir essa camisa, é ver meu time no pódio, é sentir a energia que é incalculável. Difícil dizer como é esse sentimento”, disse o treinador.
Outros homenageados da noite foram Erlon Souza (canoagem velocidade), Bruno Fratus (natação), Ágatha Rippel (vôlei de praia) e Isabel Swan (vela). Eles foram lembrados por suas carreiras bem-sucedidas. Fratus, aliás, decidiu anunciar oficialmente sua aposentadoria na premiação.
Ele disse ter sido convencido pelo também ex-nadador Gustavo Borges de que o atleta, quando para, não morre duas vezes, e sim nasce duas vezes, contrariando o conhecido aforismo. “A mensagem que deixou para quem nos assiste é: pratique esporte porque muda vidas, e, com certeza, mudou a minha”, falou o ex-nadador.
Não somente atletas se despediram. No último mês à frente do COB, o presidente Paulo Wanderley fez um discurso longo para elencar os seus feitos à frente da entidade. “Considero cumprida minha missão”, afirmou o dirigente, que será sucedido em janeiro por Marco La Porta, eleito presidente com apoio maciço dos atletas há dois meses.
Já Arthur Elias, eleito melhor treinador coletivo, citou os altos índices de violência contra a mulher e que as mulheres sejam respeitadas e valorizadas. O técnico da seleção brasileira feminina de futebol espera que o futebol feminino continue a ser apoiado por políticas públicas e pela iniciativa privada.
As homenagens póstumas foram apresentadas no telão. Zagallo, Maguila, Pampa e Luiz Onmura, além dos jornalistas Antero Greco, Silvio Luiz, foram lembrados por anos de dedicação ao esporte.
O evento foi apresentado pela atriz Larissa Manoela, madrinha do Time Brasil, e pelo humorista Paulo Vieira, apresentador da TV Globo.
PRÊMIOS PRINCIPAIS
Atletas do Ano – Rebeca Andrade e Caio Bonfim
Atleta Revelação – Gustavo “Bala Loka” (ciclismo BMX freestyle)
Atleta Influenciador do Ano – Flávia Saraiva
Atleta da Torcida – Caio Bonfim (marcha atlética)
Prêmio Inspire – Ana Sátila (canoagem)
Destaques dos Jogos da Juventude – Giovana Fioromonte (judô) e Lucio Filho (natação)
Equipe do ano: futebol feminino
Melhor Equipe mista – judô
Melhor treinador individual – Francisco Porah (ginástica artística)
Melhor treinadora individual – Sarah Menezes (judô);
Melhor treinador coletivo – Arthur Elias
Troféu Adhemar Ferreira da Silva – José Roberto Guimarães (técnico da seleção brasileira feminina de vôlei)
Prêmio Espírito Olímpico – Christian Gebara (CEO da Vivo).
VENCEDORES POR MODALIDADE
Atletismo – Caio Bonfim
Águas Abertas – Ana Marcela Cunha
Badminton – Juliana Vieira
Basquete – Marcelinho Huertas
Basquete 3 x 3 – Luana Batista
Breaking – B-Girl Mini Japa
Boxe – Beatriz Ferreira
Canoagem Slalom – Ana Sátila
Canoagem Velocidade – Isaquias Queiroz
Ciclismo BMX Freestyle – Gustavo Bala Loka
Ciclismo BMX racing – Paola Reis
Ciclismo de estrada – Ana Vitória ‘Tota’ Magalhães
Ciclismo mountain bike – Ulan Galinski
Ciclismo de pista – Wellyda Rodrigues
Desportos na neve – Zion Bethonico
Desportos no gelo – Nicole Silveira
Escalada esportiva – Rodrigo Hanada
Futebol – Lorena
Ginástica Artística – Rebeca Andrade
Ginástica Rítmica – Bárbara Domingos
Ginástica de Trampolim – Ryan Dutra
Handebol – Bruna de Paula
Hipismo adestramento – João Victor Oliva
Hipismo CCE – Rafael Lozano
Hipismo saltos – Stephan Barcha
Hóquei Sobre a Grama – Lucas Varela
Judô – Beatriz Souza
Levantamento de Peso – Laura Amaro
Nado Artístico – Marina Postal e Eduarda Mattos
Natação – Guilherme Costa, o Cachorrão
Pentatlo moderno – Isabela Abreu
Remo – Lucas Verthein
Rugby Sevens – Thalia Costa
Saltos Ornamentais – Ingrid Oliveira
Skate – Rayssa Leal
Surfe – Tatiana Weston-Webb
Taekwondo – Edival Pontes, o Netinho
Tênis – Beatriz Haddad Maia
Triatlo – Miguel Hidalgo
Tênis de Mesa – Hugo Calderano
Tiro com Arco – Marcus D’Almeida
Tiro esportivo – Geovana Meyer
Vôlei – Gabi Guimarães
Vôlei de Praia – Duda Lisboa e Ana Patrícia
Vela – Bruno Lobo
Wrestling greco-romana – Joilson Junior
Wrestling livre – Giulia Penalber
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